domingo, 14 de março de 2010

O que este PEC pressupõe...

Apesar de não conhecermos a versão final do Governo relativamente ao PEC, foi esta semana divulgada uma série de informações que nos permitem, desde já, fazer uma avaliação às medidas propostas e qual a sua razoabilidade no contexto económico-financeiro Nacional e internacional.

Para começar, centremos a nossa atenção no gráfico em baixo, no qual se parte da posição do défice público em 2009 (8,3%) para o objectivo a que Portugal se propõe, que é o de atingir um nível de défice na ordem dos 2,8% em 2013.

Fonte: Ministério das Finanças

O crescimento económico - com o consequente aumento da receita fiscal adveniente do mesmo, ao nível do IRS, IVA e IRC - assume-se como principal componente na estratégia seguida, prevendo-se uma contribuição na ordem dos 2,2%. Ora, para que tal aconteça é imperativo que de 2010 em diante Portugal cresça a uma taxa média anual na ordem dos 1,5%, o que não sendo impossível pode não ser fácil de ser obtido, sobretudo se considerarmos a natural resiliência ao nível do aumento das exportações resultante da fraca performance de algumas economias europeias que constituem o grosso da coluna das nossas trocas comerciais (com Espanha à cabeça).

O segundo maior contributo (1,2%) viria, de acordo com o plano delineado pelo Governo, da componente relativa aos custos com o pessoal, nomeadamente do efeito resultante da conjugação entre contenção salarial e limitação das entradas na função pública. Quanto à questão salarial, custa-me a compreender a razoabilidade de congelamentos salariais durante 3 anos : Portugal encontra-se à beira de uma grave crise social e o sinal enviado por uma estagnação salarial por tanto tempo poderia ser o dinamitador do rastilho social que, de certa forma, se vai fazendo sentir. Parece-me bastante mais razoável haver um maior controlo nas admissões no sector do Estado (e quando se fala no Estado fala-se não apenas no Estado Central, como nas regiões autónomas, autarquias e sector empresarial estatal).

No tocante às prestações sociais (0,6%), destaque para o congelamento e controlo das prestações não contributivas, o encurtar do subsídio de emprego, o fim das medidas anti-crise (nomeadamente custos associados ao "salvamento" de algumas instituições financeiras Nacionais) , aumento da idade de reforma para os funcionários públicos e maior controlo das despesas. Ora, de uma forma geral parecem-me medidas razoávies, embora tenha que haver muito cuidado na gestão, controlo, implementação e comunicação de duas delas - o aumento da idade da reforma (nos últimos dias têm vindo a público n versões do Governo no tocante a este tema, colocando milhares de funcionários públicos no meio de incertezas que são de evitar a todo o custo) e a redução do período de pagamento do subsídio de desemprego (preferiria, a este respeito, um maior rigor e selectividade na atribuição).

Chegamos àquela componente - investimento (0,5%) - que penso que está subestimada nesta proposta por parte do Governo. Sempre defendi que, numa fase em que o País passa por enormes dificuldades, todo e qualquer investimento relacionado com grandes obras públicas - estradas, aeroportos, TGV´s - devia ser congelado por tempo indeterminado, até ao momento em que as contas públicas permitissem a prossecução desses projectos com menor taxa de esforço. Ora, o Governo peca claramente por apenas ter previsto o adiamento por 2 anos do TGV Lisboa- Porto e Porto-Vigo.

O contributo do consumo intermédio (0,4%) passa pela criação de tectos para o "outsourcing", o corte nas despesas militares e a redução de despesas de funcionamento. Critico e sempre critiquei esta "mania de país rico" de por tudo e por nada contratar serviços a consultoras externas a valores principescos, quando certamente na função pública haverá pessoal qualificado para levar alguns desses estudos. Parece que finalmente se abriram os olhos para essa realidade. Depois critico de forma muito frontal a redução nas despesas militares: numa era em que a ameaça terrorista é cada vez maior, tendo Portugal uma costa marítima e zona económica exclusiva das maiores na Europa, estranho como é que, por exemplo, a aposta clara na construção de navios de patrulha e equipas de intervenção não é uma prioridade.

Finalmente temos uma rubrica de receitas que assume um peso de 0,8% no esforço de convergência para o défice público de 2,8% em 2013. Ora trata-se aqui de uma série de medidas, algumas delas mercem o meu aplauso (tributação das mais-valias em 20%, portagens nas SCUT, alargamento da base contributiva da Segurança Social) e outras o meu firme descontentamento (IRS de 45% para rendimentos anuais superiores a 150mil euros/ano, redução da dedução específica dos pensionistas com rendimentos acima de 22.500 euros/ano).


Os tempos são difíceis e é imperativo que o Governo tenha coragem para assumir as suas responsabilidades!